O projeto educativo neoliberal ou filósofos e sociólogos contra a máquina do capitalismo
Não se trata de nenhuma coincidência que, exatamente no momento em que se discute a saída da filosofia e da sociologia dos currículos de ensino médio em vista das mudanças provocadas pela BNCC, o IPEA publique uma pesquisa, amplamente divulgada pelos órgãos da grande imprensa, dando conta dos prejuízos causados por essas disciplinas ao ensino de matemática, sugerindo que a melhor maneira de reverter o cenário seria optar por sua exclusão.
Do ponto de vista científico, os dados apresentados sequer merecem comentários. A metodologia é superficial e rasa, e as premissas, altamente tendenciosas e ideológicas. Ao que parece, os investigadores ignoraram largamente a advertência inscrita na porta da Academia de Platão: "Que nenhum ignorante da matemática entre aqui", produzindo, para defender as ciências que consideram prioritárias, um verdadeiro contra-manifesto totalmente desprovido da lógica intrínseca do cálculo e do verdadeiro.
Mais importante que esse arremedo de investigação são as intenções que o ocasionam. Ora, quem conhece o cotidiano escolar sabe bem a condição em que a filosofia e a sociologia se encontram nos currículos da Educação Básica. Restritas temporalmente e sufocadas pela burocracia, elas se limitam a insinuar alguns aspectos históricos e mais gerais desses ramos de conhecimento, de modo que a pergunta a ser feita é por que afinal interessa tanto liquidá-las quando estas poderiam muito bem ser reduzidas a um simples e inofensivo ornamento.
Mais uma vez, os fatores econômicos emergem como primordiais. Em termos práticos, diminuir o número de disciplinas significa reduzir também os professores contratados, e, por conseguinte, as despesas com pessoal. Também quer dizer abrir mais espaço para aquelas áreas que costumam ser privilegiadas em pontuações de exames vestibulares, que tanto interessam às redes privadas de ensino, que têm sua qualidade aferida pelo número de aprovados em cursos elitizados. Desse modo, livrar-se da filosofia e da sociologia apresenta-se como uma boa oportunidade de aumento de receita.
Mas, claro, é preciso também considerar os fatores ideológicos. Estes também aparecem. No entanto, suas repercussões não surgem mais fortemente na escola. Esta já tem mecanismo eficientes de bloquear o movimento das ideias filosóficas e sociológicas. Assim, o alvo passa a ser a universidade, que tende a ver seus cursos cada vez mais esvaziados por meio da redução de campo de trabalho para estes profissionais, os quais fatalmente irão dedicar-se a outras profissões, acentuado de maneira ainda mais grave o déficit crítico das instituições de ensino superior e de toda a sociedade.
Contra esse movimento, é que a luta deve se tornar mais presente. Sem filósofos e sociólogos na escola, a sociedade perde muito, porém, sem filósofos e sociólogos na universidade, o prejuízo será total e irreversível, e o que teremos será somente jornais e institutos a propagarem imposturas científicas diante de uma plateia desprovida de todas as armas da crítica.